Manaus 356 anos: a cidade de Milton Hatoum pelo olhar do escritor imortal da ABL

  • 24/10/2025
(Foto: Reprodução)
Manaus faz 356 anos: apaixonados pela capital relembram histórias e transformações Manaus completa 356 anos nesta sexta-feira (24) com uma população estimada de 2.303.722 pessoas, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia de Estatística (IBGE). Esses milhões de rostos que dão vida à capital amazonense são objeto de estudo e de escrita do mais recente imortal da Academia Brasileira de Letras (ABL), Milton Hatoum. À Rede Amazônica e ao g1, o autor fala sobre a sua relação com a cidade natal. Entre as várias profissões de Milton, ele se destaca como escritor, professor e tradutor. Publicou oito livros, dos quais quatro são ambientados em Manaus: Relato de um certo oriente (1989) Dois irmãos (2000) Cinzas do Norte (2005) Órfãos do Eldorado (2008) De postura carismática e com seu caráter observador, Milton contou um pouco sobre as memórias de infância e a preocupação com a situação atual de Manaus. Confira a entrevista na íntegra. 📲 Participe do canal do g1 AM no WhatsApp Há quanto tempo o senhor se mudou de Manaus? Milton: “Faz uns 25, 26 anos.” Tem algum motivo específico? Milton: Eu vim para terminar um doutorado na USP e acabei me casando aqui em São Paulo, com uma pessoa daqui e aqui fiquei. E eu também queria escrever. Queria mais tempo para meu trabalho de escritor. Aí, infelizmente, tive que me desligar da Ufam e viver da minha pena, dos meus escritos. Foi quando eu terminei o ‘Dois Irmãos’, aqui em São Paulo. Isso foi em 1999, 2000, por aí. Mas eu sempre volto para Manaus quando posso. E por que é que o senhor volta? Milton: Por uma questão muito simples. Eu tenho minha irmã, tia, primos, tenho minha família, da qual uma parte mora em Manaus. Aliás, toda minha família amazônica mora em Manaus. E eu, enfim, já não tenho muitos amigos (daí), mas tem os espaços da minha infância, tem o rio Negro, que foi um dos grandes acontecimentos da minha vida. Ainda é. Então eu sinto muita saudade de tudo isso. Embora essa Manaus de hoje seja muito diferente da Manaus da minha juventude.” Diferente em que sentido? Milton: Olha, Manaus nos anos 1960, década do século passado, era uma cidade relativamente pequena e calma, que tinha uma relação muito harmônica com a natureza, sabe? Os rios, os igarapés, os banhos, que eram o nosso lazer principal. Ah, era uma cidade com pouquíssima violência. Não era uma cidade hostil. E depois a cidade, a partir dos anos 1970, cresceu de uma forma desordenada, caótica. Não houve planejamento para esse crescimento brusco ou abrupto. E o acumulado foi dando problemas durante essas décadas. Hoje Manaus é uma cidade complicada. Você sabe, é complicada do ponto de vista da mobilidade urbana. É uma cidade que não é arborizada, o que é, vamos dizer, um contrassenso. Uma cidade de clima quente e úmido não ser arborizada? Quer dizer, uma cidade praticamente sem calçadas, sem lugar para a gente caminhar, e o ideal seria caminhar na sombra. Fora os problemas mais graves, como o saneamento urbano na periferia. Falta saneamento adequado para uma parte considerável da população. A violência também, claro. LEIA TAMBÉM: Relembre a história e principais obras do escritor Amazonense Milton Hatoum Acho que tudo isso fez da minha cidade um lugar um pouco hostil, muito diferente daquela cidade da qual todos da minha geração se lembram muito bem. Que era uma cidade belíssima. E muita coisa foi destruída. E a gente precisa evitar isso, não é? Precisa-se revitalizar o Centro de Manaus, e fazer uma coisa inteligente. Por exemplo, limitar a circulação de automóveis em alguns pontos do Centro da cidade. Talvez fazer calçadões. É preciso humanizar a cidade, sabe? E é isso que eu espero dos administradores da minha cidade, humanizá-la. Eu acho muito interessante como o senhor utiliza sempre o pronome possessivo, “minha cidade”, mesmo morando há mais de 20 anos fora daqui. O senhor pode falar um pouco mais sobre isso? Milton: Eu nasci em Manaus. É a minha cidade. Não tenho outra. Quer dizer, eu gosto de tantas outras onde morei, no Brasil e no exterior. Mas a cidade da infância é, na verdade, a nossa cidade, do ponto de vista afetivo e simbólico. Então, é a cidade onde eu me sinto em casa. Mas a minha casa foi muito maltratada nessas últimas décadas. Eu não falo desse ou daquele administrador ou prefeito. Eu acho que de um modo geral foi maltratada. Acho que é preciso formar uma equipe inteligente, que tenha amor pela cidade e pense no planejamento urbano, em estratégias urbanas e arquitetônicas, que humanizem a cidade. Que tornem a cidade um espaço de convívio. Isto acho fundamental. Mas não é só Manaus que é assim. Há tantas outras cidades complicadas no Brasil todo. Assim como Manaus, às vezes vou para o interior de São Paulo e vejo poucas árvores, e me pergunto: por que os prefeitos não arborizam suas cidades? O mundo todo está fazendo isso. E no caso de Manaus e das outras capitais da Amazônia, elas são de uma região de clima equatorial. Então é mais um motivo para a gente pensar nas áreas de sombra e de conforto térmico. Eu até falei disso em alguns romances, como ‘Dois Irmãos’, ‘Cinzas do Norte’, que eu acho que têm um pouco da decadência da cidade e da destruição de seu Centro Histórico. O que é um absurdo. Qual a sua mensagem para o aniversário de Manaus? Mesmo com todos os problemas e questões daqui, por que escrever e por que sentir Manaus? Milton: Eu escrevi quatro romances ambientados em Manaus e alguns contos. Por que fiz isso? Porque todo escritor e toda escritora, de algum modo, escrevem sobre a sua infância e a sua juventude. E a memória desempenha um papel fundamental nisso. Mesmo ausente de Manaus, estou sempre voltando à cidade onde nasci. Por João Santana, sob supervisão de Jacqueline Nascimento. Escritor Milton Hatoum Divulgação

FONTE: https://g1.globo.com/am/amazonas/noticia/2025/10/24/manaus-356-anos-a-cidade-de-milton-hatoum-pelo-olhar-do-escritor-imortal-da-abl.ghtml


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